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sexta-feira, 21 de novembro de 2014

O racismo e a exploração capitalista

20 Nov 2014

Nos últimos meses, os inúmeros casos de racismo ocorridos no futebol brasileiro e na sociedade como um todo mostram que somos sim um país racista.

Senão vejamos: de acordo com dados do IBGE, a população brasileira conta atualmente com 202,7 milhões de pessoas, sendo que, deste total, 53% se declara negra ou parda. Apesar de serem a maioria da população, os trabalhadores negros ganham, em média, pouco mais da metade (56%) do rendimento recebido pelos trabalhadores brancos.

Trocando em miúdos, os negros possuem uma média salarial de R$ 1.334,79, enquanto que a média dos assalariados de cor branca é de R$ 2.396,74. Ou seja, tem razão Elza Soares quando canta que “a carne mais barata do mercado é a carne negra”.

Quando observamos sob o ponto de vista de gênero, as diferenças são ainda maiores: enquanto as mulheres brancas recebem aproximadamente 70% daquilo que recebem homens brancos, as negras ganham pouco mais de 40% daquilo que recebem os trabalhadores brancos do sexo masculino.

Os dados acima reforçam algo que já é sabido: a população negra brasileira se concentra nas camadas mais pobres da sociedade.

Segundo pesquisa realizada pelo Laboratório de Análises Econômicas, Históricas e Estatísticas das Relações Raciais (Laeser), a partir de dados da PNAD 2006, entre as pessoas que trabalham para outros exercendo funções sem remuneração (ou seja, não recebem qualquer pagamento pelo trabalho), somente 16,8% são homens brancos. Mulheres brancas e homens negros são 27%, e mulheres negras somam 29%.

Entre os trabalhadores remunerados, 58% das empregadas domésticas sem carteira assinada são mulheres negras, enquanto 36% são brancas. Já entre as que possuem carteira assinada, 41% são brancas e 48%, negras.

Nos setores em que a remuneração e a estabilidade profissional são maiores, porém sem carteira assinada, os homens negros são maioria (40%). Essa relação se inverte quando tratamos de empregados com carteira assinada. Nesse caso, 34,3% são homens brancos e apenas 28% são negros. As mulheres brancas são 22% das trabalhadoras com carteira assinada, enquanto as negras são 13%.

As diferenças persistem quando tratamos dos trabalhadores autônomos. Entre os que não possuem nível superior, 31% são homens brancos e 36% negros (as mulheres brancas e negras somam 16% cada). Para os que têm formação universitária, as diferenças raciais aumentam, enquanto as de sexo diminuem: homens e mulheres brancas são 43% e 37%, respectivamente, ao passo que homens e mulheres negras somam apenas 11% e 6,1%, cada.

Apenas no funcionalismo público, é que as diferenças de cor da pele e sexo são um pouco menores. Homens brancos são 24,7%, mulheres brancas 33,1%, homens negros 19,5% e mulheres negras 21,9%.

Racismo e desemprego


O racismo e a desigualdade entre homens e mulheres também estão presentes entre os desempregados. De acordo com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a taxa de desemprego da população de 16 anos ou mais de idade, segundo sexo e cor da pele, em 2009, era para os homens brancos e negros de 5,3% e 6,6%, respectivamente. Já entre as mulheres brancas e negras era de 9,2% e 12,5%.

Nem mesmo a maior escolaridade iguala os salários de homens e mulheres, negros e brancos. Na comparação entre homens com ensino fundamental, os negros recebem em média 76% do salário dos brancos. Entre os que possuem ensino médio, os negros recebem 74% do que ganham os homens brancos.

Segundo estudo do Dieese, quanto maior o nível de escolaridade maior a diferença salarial entre brancos e negros. Por exemplo, na indústria de transformação a desigualdade de rendimento por hora dos negros em relação aos não negros é de 18,4% entre os que possuem ensino fundamental incompleto, e de 40,1% para aqueles com ensino superior completo.

Todos esses dados revelam o profundo racismo existente na sociedade brasileira e nas relações de trabalho. Apenas quando são levadas em conta somente as aptidões intelectuais dos trabalhadores, as desigualdades racistas e machistas diminuem, como no caso do serviço público, onde a maioria das admissões é realizada por meio de concurso público, não importando a cor e (ou) sexo da pessoa. Porém, é preciso relativizar este fato e identificar o racismo e o machismo também aí, uma vez que a maioria dos postos de chefia no serviço público ainda é ocupada por homens brancos.

O racismo no mercado de trabalho


Em 2013, a Associação Brasileira de Recursos Humanos, de Santa Catarina, divulgou a existência de cerca de sete mil postos de trabalho à disposição no Estado. De acordo com o anúncio, o perfil procurado pelas empresas é de homem branco, entre 25 e 35 anos de idade. À época, nem todas as vagas foram preenchidas, pois os candidatos não tinham “as habilidades e competências necessárias”, ou seja, não correspondiam ao perfil exigido pelos patrões.

Apesar de tal fato ter passado impune, impor condições raciais para contratar funcionários, em qualquer que seja a empresa, é considerado pela Constituição ato racista, ou seja, é ilegal. O que observamos todos os dias nas relações de trabalho no Brasil é um racismo velado, no qual palavras referentes à cor da pele na maioria das vezes não são citadas, mas estão implícitas nas escolhas feitas na hora de contratar ou promover alguém.

No encontro nacional do Movimento de Mulheres Olga Benario, realizado em maio deste ano, no Recife, vários relatos de racismo no trabalho foram apresentados. “Se uma jovem branca, de cabelos lisos, especialmente se for loira e de olhos azuis, aparecer para ocupar uma vaga de emprego nos shoppings e estabelecimentos comerciais daqui, uma pessoa negra não tem a menor chance de conseguir aquela vaga, independente das qualificações das candidatas”, disse uma das companheiras presentes.

Esse tipo de discriminação acontece, na maioria das vezes, de forma inconsciente, pois o racismo e o machismo estão enraizados em nossa cultura e na ideologia dominante da sociedade de classes. Quem desconhece que os trabalhadores negros são direcionados para ocupar os cargos de menor remuneração? Ou que as promoções no emprego são preferencialmente para os homens brancos? Não faltam justificativas para tal discriminação: dizem que os clientes preferem ser atendidos por brancos, ou que os negros têm menor produtividade ou uma “educação diferenciada”, etc.

A quem interessa o racismo?


Na sociedade capitalista, em que a riqueza é resultado da exploração da força de trabalho dos operários e das operárias, os capitalistas têm todo o interesse em pagar os menores salários aos trabalhadores, pois, assim, seus lucros serão ainda maiores.

A burguesia, por isso, tem todo o interesse em manter e desenvolver o racismo e o machismo nas relações de trabalho para justificar as diferenças salariais entre brancos e negros, e entre homens e mulheres.

Logo, é evidente que o capitalismo, mesmo após a abolição legal da escravatura, aproveita- se do racismo e do machismo para aumentar a exploração sobre os trabalhadores, ainda mais no Brasil, país onde a escravidão da população negra existiu por quase 400 anos e mantém forte influência ainda hoje.

Quando a escravidão foi “abolida” em nosso país, em 1888, a maioria dos postos de trabalho era ocupada por negros, ainda escravos ou já libertos. A nova burguesia nascente preferiu jogar essa massa de trabalhadores no desemprego e contratar em seu lugar imigrantes europeus, sob a justificativa de que o trabalhador branco era “superior” ao negro na cultura, na produtividade, etc., e que traria “civilidade” ao Brasil republicano.

Os ricos foram além e passaram a dizer que a responsabilidade pela pobreza existente no Brasil era da grande quantidade de negros que aqui viviam. Assim, implementaram na Primeira República o chamado “Projeto Eugenista para o Brasil”, que visava a “embranquecer” a população.

Enquanto os imigrantes europeus tinham emprego e moradia garantidos, os negros engrossaram o exército de reserva do capitalismo e, sem terem onde morar, passaram a formar as primeiras favelas do país. Além disso, os imigrantes não se identificavam com o trabalhador negro, pois eram tratados de forma diferenciada. Assim, a burguesia brasileira conseguiu, desde a formação do nosso mercado de trabalho, implementar dois dos principais objetivos dos capitalistas: reduzir o preço da mão de obra através do aumento do desemprego, e dividir a classe trabalhadora, enfraquecendo sua luta contra os patrões.

Porém, engana-se quem pensa que somente os trabalhadores negros são prejudicados com o racismo. A flutuação dos salários, assim como o preço de qualquer mercadoria, gira em torno de um valor médio. Quanto mais baixos forem os salários, menor será a média salarial paga ao conjunto da classe trabalhadora. Por isso, os trabalhadores, brancos ou negros, homens ou mulheres, precisam estar conscientes de que seu inimigo principal não é seu companheiro de trabalho, mas o capitalista, e que qualquer “privilégio” racial ou de gênero dado pelos patrões não tem outro objetivo senão o de dividir a classe.

É preciso desenvolver a consciência de que, quando um trabalhador se sente superior ao outro por ser branco ou por ser homem, está reproduzindo a ideologia da classe que o explora e se distancia dos outros trabalhadores.

Eloá dos Santos, Rio de Janeiro

Fonte: A Verdade

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